A Black Friday completa uma década no Brasil em 2020, e deve registrar números recordes de vendas online. Porém, para as montadoras de veículos esta não será uma edição das mais festivas.

Diante da previsão de queda de 35% nos emplacamentos de carros neste ano, e com os sucessivos aumentos de preços causados pela alta do dólar nos últimos meses, as empresas estão mais discretas.

Apenas alguns fabricantes anunciaram campanhas da Black Friday em seus sites oficiais. Há poucos anúncios circulando. Entre as marcas de luxo, praticamente nenhuma aderiu à data no Brasil.

“Não estamos vendo promoção de Audi, BMW, Mercedes-Benz ou Volvo. Por quê? Essas marcas estão sofrendo, porém nessa faixa mais seletiva as pessoas continuam consumindo carros', explica Antonio Jorge Martins, economista e coordenador de cursos automotivos da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Para Martins, quem está sofrendo mais com a pandemia é o nicho de escala. “A renda per capita se reduziu e ninguém está atacando o preço final. O foco está onde as pessoas conseguem chegar. O consumidor ainda enxerga muito o que cabe no bolso', avalia o professor da FGV.

Nesta Black Friday 2020, a maioria das marcas apostará nas vendas a crédito. A Ford foi a primeira montadora a anunciar campanha.

A condição diferenciada de compra pede 20% de entrada e o restante do valor diluído em 60 meses. Um Ka hatch 1.0 S é vendido com entrada de R$9.900 e 60 parcelas de R$ 915.

“Estudamos o que os clientes estavam buscando para este momento, e notamos que a entrada menor e o prazo mais extenso permitiriam a compra do veículo', aponta Marcel Bueno Silva, gerente de marketing de varejo da Ford do Brasil.

Faz algum tempo que o mercado não oferecia prazo de cinco anos. Inclusive o executivo da Ford reconhece que é uma oferta de momento. “É um formato de oportunidade, super atrativo para o consumidor. É pouco provável que seja duradouro', completa.

Na Volkswagen a estratégia é parecida, porém com enfoque nas parcelas baixas. Este é o mote dos anúncios dos modelos Nivus e T-Cross.

O Nivus Comfortline 200 TSI equipado com motor 1.0 turbo e câmbio automático é anunciado por 36 parcelas de R$ 990. Porém, o modelo custa R$ 89.150 à vista. Essa opção exige uma entrada de 68% (ou R$ 60.622). Ao final, o crossover terá custado R$ 96.262.

No site da Renault, a chamada da “Black Week' impressiona: R$ 1.000 de entrada em dez vezes no cartão de crédito para levar um Kwid. O restante é pago em parcelas mensais de R$ 1.060,27.

Porém, é preciso estar atento às letras miúdas. Neste caso, a marca francesa cobre praticamente 100% do valor do veículo pelo Banco RCI. E o Kwid custará R$ 64.616,28 ao final do financiamento de 60 meses. E sairá R$ 17.626,28 mais caro que o preço à vista de R$ 46.990.

A sedução provocada por alguns anúncios é um ponto a ser observado, diz Fernando Capez, diretor executivo do Procon-SP. Como em todos os anos, o órgão de proteção e defesa do consumidor está monitorando as ofertas neste período de promoções da Black Friday.

“As montadoras e concessionárias devem ter responsabilidade para não iludir o comprador e depois tirar o veículo dele, deixando-o endividado', aponta Capez.

Para o diretor do Procon-SP, o automóvel preocupa pelo núcleo de superendividados. Como a maioria dos veículos é financiada, esse superendividamento surge das falsas promoções.

“As pessoas adquirem o veículo em um momento de entusiasmo, de influência da publicidade enganosa. Aí, durante os 60 meses do financiamento o cidadão não consegue fazer nenhuma outra despesa, sob pena de onerar o seu orçamento', explica Fernando Capez.

Com a pandemia e o confinamento, as montadoras tiveram de correr para levar as concessionárias para a casa dos clientes. Essa mudança estava em curso, porém precisou ganhar aceleração. E isso pode fazer a diferença nesta edição da Black Friday.

A Volkswagen é uma das montadoras que já digitalizou 100% da rede. Segundo Gustavo Schmidt, vice-presidente de vendas e marketing da empresa, o sistema DDX (Digital Dealer eXperience), criado pela marca, permite que a venda seja feita totalmente de forma digital.

“A nossa expectativa é viabilizar segurança, conforto, conveniência e praticidade aos nossos clientes e vendedores da VW. A melhoria dos resultados será consequência', diz Schmidt.

As novas estratégias vão muito além do contato via WhatsApp e Facebook Messenger, ou de serviço de drive-thru. Algumas ferramentas permitem monitorar os clientes e ativá-los com base em seus gostos pessoais.

“Hoje eu tenho como saber o que a pessoa procura na internet, se ela quer um Mercedes-Benz ou um Porsche. Há estratégias apuradas de gestão de lead que utilizam a neurociência e a geolocalização', explica o coordenador de cursos automotivos da FGV, Antonio Jorge Martins.

Para o economista da FGV, não há mais como fugir desse novo modelo de vendas baseado em algoritmos e regido pelas leis de proteção de dados. “O comprador não está mais indo à concessionária. A saída é gerar dados para as equipes chegarem até ele', conclui Martins.



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